A Controladoria-Geral da União (CGU) publicou, em setembro de 2025, o Guia de Identificação e Quantificação da Vantagem Econômica Auferida, com o objetivo de padronizar critérios e metodologias utilizados em processos administrativos de responsabilização e na celebração de acordos de leniência, conforme a Lei nº 12.846/2013 (Lei Anticorrupção).
O documento reúne entendimentos práticos da CGU e da Advocacia-Geral da União (AGU), além de incorporar referências internacionais da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), Organização das Nações Unidas (ONU) e Banco Mundial.
Na prática, o guia representa um avanço importante para garantir maior previsibilidade, transparência e proporcionalidade na aferição das vantagens econômicas obtidas por ilícitos tipificados na Lei Anticorrupção.
Por que a quantificação da vantagem é importante?
O artigo 19 da Lei Anticorrupção prevê que empresas condenadas podem sofrer o perdimento da vantagem econômica obtida com o ilícito, além da multa administrativa. O Decreto nº 11.129/2022 determina que, sempre que possível, a multa não poderá ser inferior ao valor da vantagem auferida.
Na prática, a correta mensuração do ganho indevido impacta:
- o valor final das multas;
- a negociação e o custo de acordos de leniência;
- auxilia na delimitação de sequestro cautelar de bens;
- o risco de perda judicial de bens, direitos e valores obtidos com a infração;
- a gestão de riscos e provisões contábeis em empresas sob investigação.
Por isso, compreender os critérios definidos pela CGU é essencial para empresas investigadas.
Quais metodologias o guia apresenta?
O artigo 26 do Decreto nº 11.129/2022 estabelece três metodologias principais para a apuração da vantagem auferida:
- Contratos administrativos – quando o ilícito envolve licitações ou contratos públicos, a vantagem corresponde à receita recebida, subtraídos os custos lícitos comprovadamente incorridos. A CGU reforça que deve ser devolvido o lucro total do contrato, e não apenas o “excedente” obtido com a fraude.
- Custos evitados – aplica-se quando a empresa se beneficia de decisão administrativa irregular que a isenta de despesas. Exemplo: pagamento de propina para evitar multa tributária ou que concede benefício fiscal indevido. O valor da multa ou custo evitado configura a vantagem indevida.
- Lucros adicionais – quando a conduta ilícita gera aumento de receita. Exemplo: obtenção indevida de licença ambiental que permite explorar atividade econômica. A base de cálculo será o lucro adicional obtido com essa autorização.
O guia também trata de situações específicas:
- Uso da propina como referência – quando não for possível mensurar a vantagem, admite-se usar o valor da propina paga como valor mínimo.
- Prejuízo contábil – como regra, prejuízos não podem ser deduzidos, salvo se comprovadamente vinculados ao negócio, para evitar manipulações artificiais.
- Diferença entre dano e vantagem – o guia distingue o ressarcimento ao erário (de natureza civil) do perdimento da vantagem auferida (de natureza sancionatória), prevenindo cobranças duplicadas.
Quais os impactos práticos para as empresas?
A publicação do guia reforça a mensagem de que “violar a lei não compensa”.
Para as empresas, os principais efeitos são:
- Previsibilidade regulatória: critérios claros reduzem a incerteza em negociações de acordos e processos administrativos.
- Gestão de riscos: permite ajustar provisões contábeis e simular impactos financeiros em cenários de responsabilização.
- Governança corporativa: reforça a importância de programas de integridade robustos, capazes de evitar práticas ilícitas.
- Alinhamento internacional: aproxima o Brasil de padrões globais no combate à corrupção, fortalecendo a confiança de investidores.
O novo guia da CGU sobre a quantificação da vantagem auferida é um marco para a aplicação da Lei Anticorrupção. Ao estabelecer critérios objetivos e fundamentados, contribui para a segurança jurídica e reforça o caráter dissuasório das sanções.
Para as empresas, o recado é claro: investir em compliance é a forma mais eficaz de evitar custos elevados e danos reputacionais decorrentes de ganhos ilícitos.