Em decisão recente (Recurso Especial nº 2.163.919-PR), a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmou o entendimento relevante para o planejamento sucessório: o pagamento do legado de renda vitalícia previsto em testamento pode ser exigido desde a abertura da sucessão – ou seja, antes mesmo da conclusão do inventário, salvo se o próprio testamento determinar o contrário.
O que é um legado de renda vitalícia?
É uma disposição testamentária pela qual o testador garante a alguém o direito de receber uma quantia mensalmente (ou em outra periodicidade), como uma pensão, pelo resto da vida dessa pessoa. Trata-se de uma ferramenta de proteção à subsistência do beneficiado.
O caso julgado pelo STJ
No caso julgado, o falecido, casado sob o regime da separação convencional de bens, deixou testamento em que destinou a parte disponível de seu patrimônio às filhas e instituiu um legado de renda vitalícia em favor da esposa sobrevivente.
Durante o inventário, a viúva solicitou o início do pagamento da renda mensal, e o pedido foi inicialmente atendido pelo juízo de primeira instância.
No entanto, em recurso apresentado pelas filhas, o Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) suspendeu os pagamentos, entendendo que eles só poderiam ser exigidos após a conclusão da partilha dos bens (finalização do inventário). Isso levou à apresentação de recurso ao STJ.
A Ministra Nancy Andrighi, relatora do caso no STJ, deu razão à viúva. Ela destacou que, ao contrário de outros tipos de legado, o legado de renda tem natureza alimentar e não deve ficar condicionado à finalização do inventário, pois sua finalidade é justamente assegurar o sustento do beneficiário.
O que decidiu o STJ?
A Corte atendeu ao recurso apresentado pela viúva, reconhecendo que o pagamento do legado de renda vitalícia, diferentemente das demais espécies de legado, é exigível desde a morte do testador (abertura da sucessão), independentemente da conclusão do inventário, e deve ser pago pelos herdeiros na proporção de suas heranças, salvo disposição contrária no testamento.
Isto porque o legado de renda visa garantir a subsistência do legatário (no caso dos autos, a viúva), não sendo razoável aguardar a finalização da partilha.
Neste contexto, não tendo o testador estabelecido outra data para o início do pagamento, nem condição suspensiva para a sua exigibilidade, e inexistindo ação judicial que questione a validade do testamento, o pagamento do legado de renda vitalícia é devido a partir da morte do testador (data da abertura da sucessão). Assim, cabe às herdeiras o dever de efetuar os pagamentos desde então, na proporção de suas partes da herança, independentemente da conclusão do inventário.
Por que essa decisão importa?
A decisão do STJ reforça a eficácia imediata do legado de renda vitalícia e protege o direito do beneficiário de receber os valores a que tem direito sem ter que esperar o fim do inventário, que muitas vezes é demorado. Também contribui para a segurança jurídica no cumprimento das disposições testamentárias e reconhece o caráter assistencial desse tipo de legado.