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Créditos extemporâneos do PIS/PASEP e da COFINS e a nova Súmula do CARF: segurança jurídica ou burocracia desnecessária?

Créditos extemporâneos do PIS/PASEP e da COFINS e a nova Súmula do CARF: segurança jurídica ou burocracia desnecessária?

25/09/2025

No último dia 5 de setembro, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) aprovou nova Súmula, de nº 231, segundo a qual o aproveitamento de créditos extemporâneos das contribuições para o Programa de Integração Social/Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/PASEP) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS) demanda a apresentação da Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF) e Demonstrativo de Apuração de Contribuições Sociais (DACONs) retificadores, comprovando os créditos e os saldos credores dos trimestres originários a que se referem. 

As Súmulas do CARF, em regra, são de observância obrigatória apenas para os julgadores do próprio Conselho, estabelecendo o entendimento a ser adotado no julgamento dos processos administrativos. No entanto, o Ministro da Fazenda pode atribuir à Súmula efeito vinculante, por meio de ato próprio, tornando a sua adoção obrigatória para a Receita Federal do Brasil e para a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional.  

O assunto é relevante, pois é comum as pessoas jurídicas identificarem a existência de créditos não apropriados nas respectivas competências, em razão de mero lapso involuntário. Geralmente, esses créditos extemporâneos são escriturados de uma só vez no mês em que são identificados, pois os lançamentos nas competências originárias exigem a retificação, período a período, das obrigações acessórias. 

O entendimento norteador da Súmula, embora se encontre no próprio CARF inúmeros precedentes divergentes, foi o de que a certeza e liquidez dos créditos extemporâneos dependem da recomposição dos créditos e débitos dos períodos anteriores, por meio da retificação da DCTF e DACONs, com o objetivo de comprovar o seu não aproveitamento anterior (isto é, entre o mês do gasto e o mês do aproveitamento extemporâneo). 

Embora legítima a preocupação de evitar a utilização de créditos em duplicidade, a Súmula traz burocracia e complexidade desnecessárias. Revela apego exagerado ao formalismo e desprezo ao princípio da verdade material (ou verdade real) que baliza a atividade administrativa, cujo teor impõe o esclarecimento dos fatos como eles realmente ocorreram, e não apenas com base nos documentos formais de prova. 

Nesse sentido, a Súmula merece algumas críticas: 

1ª) as leis nº 10.637/02 e nº 10.833/03 (arts. 3º, § 4º) não estabeleceram requisito para a fruição do crédito extemporâneo, a não ser a existência da despesa que o gerou. Logo, o Fisco não pode negar o reconhecimento do direito material (crédito líquido e certo) apenas em razão da inobservância de obrigações acessórias que o ordenamento jurídico sequer exigiu. Não é a retificação formal da DCTF e da DACON que materializa a existência do crédito, mas a realização da respectiva despesa e sua comprovação; 

2ª) há, tanto na extinta DACON quanto na Escrituração Fiscal Digital das Contribuições (EFD), campos destinados ao lançamento dos créditos extemporâneos, permitindo ao Fisco que deles conheça e exerça a sua fiscalização. Portanto, havendo dúvida quanto ao aproveitamento em duplicidade do crédito anacrônico, o Fisco pode, em diligência ou fiscalização, recompor toda a escrituração do PIS/PASEP e da COFINS, seja para avalizar a existência do crédito seja para glosá-lo e exigir eventual saldo devedor das contribuições; 

3ª) ao condicionar o reconhecimento do crédito extemporâneo à retificação da DCTF e DACON do período originário e à recomposição da escrituração, o Fisco atrai para si maior ônus. Pressupondo que a empresa apresente mensalmente débitos do PIS/PASEP e da COFINS (ao invés de saldos credores), o lançamento do crédito extemporâneo no período originário pode resultar na redução do respectivo saldo devedor liquidado, gerando indébito tributário a ser recuperado via PER/DCOMP ou ação judicial. Assim, além de não haver redução do uso da máquina administrativa e/ou da litigiosidade, o indébito é atualizado pela Selic desde o pagamento indevido, ao passo que os créditos extemporâneos lançados no mês de sua apuração o são pelo valor histórico. 

4ª) a exigência de retificação das obrigações acessórias e lançamento do crédito extemporâneo no período originário também coloca a empresa em situação delicada. Ainda que o seu crédito seja legítimo, isto é, esteja respaldado na documentação contábil/fiscal que comprova a realização da despesa, ela deverá exercer o controle meticuloso sobre as retificações mensais das DCTFs e DACONs, sob pena de perda do crédito. Em outras palavras, o descuido pelo contribuinte quanto ao cumprimento de uma obrigação acessória poderá levar à perda do direito material existente. 

A conclusão, portanto, é de que a Súmula do CARF pecou pelo excesso de formalismo. Não se pode admitir que um crédito legítimo, embasado na documentação contábil/fiscal que respalda a ocorrência da despesa e requerido dentro do prazo prescricional, seja negado sob o único fundamento de não ter sido retificada previamente uma obrigação acessória.         

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