A recente decisão da Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que condenou a Telefônica a pagar mais de R$ 1,5 milhão a um ex-funcionário por softwares desenvolvidos durante o contrato de trabalho, trouxe lições importantes para empresas que usam a inovação como estratégia. O julgamento reconheceu que, apesar de o desenvolvimento de software estar dentro das atribuições do cargo, o alto retorno financeiro gerado pelos sistemas justificava uma compensação adicional. Para o TST, teria havido um ajuste tácito e uma expectativa legítima de remuneração extra, mesmo sem cláusula contratual específica.
Essa interpretação modifica o entendimento tradicional das leis de propriedade intelectual, como a Lei do Software (Lei nº 9.609/98) e a Lei da Propriedade Industrial (Lei nº 9.279/96), que determinam que os direitos patrimoniais de criações feitas no escopo do trabalho e com recursos da empresa pertencem ao empregador. O que está em jogo, portanto, é a tensão entre a segurança jurídica buscada pelas empresas e a valorização da contribuição individual do trabalhador que gera inovação acima do esperado.
Ao admitir a possibilidade de indenização sem previsão contratual, a decisão cria um cenário de insegurança jurídica, especialmente em setores como tecnologia, finanças, comunicação e jogos eletrônicos, onde a fronteira entre atividade comum e inovação extraordinária é tênue. Esse precedente abre espaço para pedidos de remuneração extra quando as criações do empregado gerarem ganhos relevantes à empresa, mesmo que tais atividades estivessem dentro da função originalmente contratada.
Esse risco é ainda maior em contratos antigos ou genéricos, que não detalham as atribuições do empregado. Nessas situações, é mais fácil alegar que a inovação extrapolou o escopo contratual, ampliando o potencial de disputas. O resultado é um ambiente jurídico mais incerto, em que empresas precisam repensar como gerenciam talentos, inovação e propriedade intelectual de forma integrada.
Como as empresas podem se proteger?
Para enfrentar esse cenário, é essencial que empregadores adotem medidas que unam segurança jurídica e estímulo à inovação. Algumas práticas recomendadas são:
- Revisar os contratos de trabalho, detalhando funções e prevendo regras sobre propriedade intelectual e pagamento por criações.
- Criar políticas internas claras sobre inovação, uso de recursos da empresa e reconhecimento de contribuições relevantes.
- Documentar os processos de criação e delegação de tarefas, registrando quando uma solução decorre da atividade rotineira ou de esforço adicional.
- Estabelecer programas de incentivo à inovação com critérios definidos, transformando o reconhecimento em política clara, e não em possível litígio.
Essas medidas reduzem o risco de disputas e fortalecem a cultura de inovação, mostrando ao empregado que suas ideias são valorizadas em um sistema transparente e previsível.
O que o caso sinaliza para o futuro?
O caso da Telefônica pode marcar uma mudança na forma como o Judiciário interpreta o equilíbrio entre os direitos do empregador sobre criações no trabalho e o reconhecimento do empregado inovador. Estamos diante de um precedente que pode afetar diversos setores, exigindo mais cautela e sofisticação na gestão de pessoas e ativos intangíveis.
Enquanto não houver uma definição clara na Justiça ou mudança na legislação, cabe às empresas se proteger com contratos bem elaborados, políticas internas sólidas e programas objetivos de incentivo. Assim, será possível transformar inovação em vantagem competitiva, e não em fonte de litígios.